quinta-feira, janeiro 23, 2014

Invocação e Evocação




Apesar de termos corriqueiros na pratica de um magista, e de fato não seja tão difícil diferenciá-los, o fato é que a confusão entre 'invocação' e 'evocação' é comum.
Claro, na hora de escrever, é comum a gente acabar se confundindo e trocando um termo pelo outro. Mas erros gramaticais à parte, é de suma importância que tenhamos em nossas cabeças as diferenças claras entre os dois.

Uma vez, vi uma tabela onde se eram numeradas as diferenças entre um mago e um bruxo. Dentre os pontos estava que, geralmente, um bruxo trabalha com a natureza e o mago trabalha para controlar a natureza¹.
(1 - Na frase, considere um significado mais amplo para a palavra "natureza").
Na bruxaria moderna e contemporânea, a prática do traçar o Círculo tornou-se constante. Além de proteção, é também o momento onde o bruxa delimita um espaço que é limite entre o domínio dos homens e o reino dos deuses, consagra um espaço para seus trabalhos e mágicos e que seja limpa das interferências mundanas para receber as divindades invocadas.
Lembre-se que, na bruxaria, a linha que separa o sagrado e o profano é sempre tênue.



Agora em um ritual de magia cerimonial, na Goétia clássica por exemplo, o Círculo, munido de inúmeros símbolos e nomes divinos, tem como principal objetivo proteger o magista da entidade evocada e de interferências externas. Aqui o daemon não é chamado para o espaço consagrado, mas sim para ficar preso no triângulo de manifestação.
Além disso, o Círculo ganha o caráter de microcosmo, um pequeno espaço criado pelo magista e que vem reafirmar seu potencial divino. O mago torna-se deus do próprio círculo, reafirmando sua capacidade de evocar e dominar a criatura evocada.
De forma semelhante o bruxo evoca os quatro elementos como torres de vigia, protegendo o Círculo.

A Verdadeira Invocação


Konstantinos, no livro Bruxaria Noturna (disponível para download na biblioteca virtual da página), faz uso do termo Verdadeira Invocação, onde o bruxo assume mentalmente e energeticamente a forma da divindade.
Não vou reescrever o trecho aqui porque isso é um saco. Em vez disso vou dar um resumo.

O primeiro passo é, acredite se quiser, estudar! Sim, você nunca para de estudar na bruxaria, aceite isso. Mesmo que vá invocar uma divindade ao qual você já considera intima, não importa, estude-a mais. Leia
O Circulo - The DruidCard Tarot
tudo que pode, compile suas próprias notas e atributos. Após juntar os dados específicos sobre o deus em particular, você deverá escrever uma invocação para ele. É mais fácil do que se pensa, ao estudar o deus você deve ter se deparado com inúmeros hinos que lhe servirão de inspiração.
Certifique-se que sua invocação tenha uma boa quantidade de particularidades sobre a divindade em questão relacionadas com o intento do ritual – por exemplo, as divindades gregas possuem epítetos, onde uma qualidade especifica do deus pode ser chamado. Em um caso especifico, Hekate como Portadora da Luz (Phosphoros) seja mais relevante a ser invocada que a Hekate Brimô (a terrível).
De qualquer forma, quanto mais você ler, mais anotações terá à disposição.
Não vejo razão para se torturar linha por linha escrevendo uma invocação mega poética. Se você tem facilidade e talento para isso, tudo bem, mas muitas vezes, palavras claras e intentos objetivos são melhores para se trabalhar.
Estabelecendo padrões, na invocação você deve, 1. Identificar a deidade; 2. Afirmar a razão pela qual você precisa daquela deidade; 3. Convidá-la à aparecer.
No meu exemplo, vou usar Hefesto. Considerando que estou escrevendo a invocação, subentende-se que eu já estudei tudo que eu podia sobre o mesmo.

Famoso artesão coberto de fuligem,De belas obras e criatividade divinalInvoco-te Hefesto, para que eu possa comungar com teu talento.Artista absoluto que nunca se rende à humilhação e rejeição,Esteja comigo agora, conceda-me sua postura férrea.Conceda-me a honra de tua presença.

Agora observe que os três pontos estão na invocação acima – estão misturados e repetidos, mas todos estão lá. Este foi um exemplo simples. Na sua invocação é provável que você tenha um objetivo mais claro. Em todo caso, exaltei certas características de Hefesto. A beleza de suas artes, seu talento, e principalmente sua postura a qual não se rende à rejeição e humilhação.

Hefesto foi renegado por sua mãe Hera por sua feiura, mas a beleza em suas obras era tamanha que a deusa reconsiderou. E por duas vezes ele respondeu as humilhações sofridas usando seu oficio. Uma vez prendendo Hera em seu trono, outra prendendo Ares e Afrodite no leito e expondo o adultério para todo o olimpo.

As palavras escolhidas vão ajudá-lo a encontrar a centelha divina dentro de si mesmo.
Geralmente, uso das palavras é usado nos rituais no que Konstantinos chamou de 'invocação comum' é o suficiente. Mas é justamente nisso que se difere esta Invocação Verdadeira, onde você faz uso de visualização, gestos e "atuação" para conseguir mais poder em um determinado ritual.
Você obtém de um ritual o proporcional de seu esforço para realiza-lo – falo aqui de esforço pessoal! Não estou dizendo que todo ritual que você for usar, para ser eficaz, precisa ser mega complexo, com invocações em egípcio antigo e coisas do gênero. Pequenos rituais, pequenos gestos, também possuem grande poder. Mas a magia não acontece por gestos teatrais. É preciso poder, é preciso crer nas palavras que são ditas, é preciso foco, doar para receber.
O conhecimento que você acumula ao escrever a invocação pode ser aplicado à criação de poder por meio da visualização. Muito da magia se resume em visualização. Ao estudar os mitos da divindade, você sente melhor sua personalidade e pode construir melhor uma imagem pessoal de como seria a possível aparência do deus. Permita que essa imagem fermente na sua consciência, pois você irá usá-la.
Símbolos externos também serão necessários. Procure reunir elementos que ativem todos os seus sentidos. Alguma pedra associada para que você a segura enquanto faz a invocação, incensos com aromas de plantas associadas, essas mesmas plantas para serem queimadas no altar, a bebida que geralmente é ofertada... Preparar o ambiente com tais elementos, mais do que para agradar Hefesto – neste caso – a aparecer, é para que você mesmo, sua mente, irá, de forma mais fácil, relacionar-se mais facilmente com aquela corrente energética especifica.
Símbolos e correspondências pessoais são encorajados. Mas sensatez, por favor! Nada de Coca-Cola Zero para Hekate ou algo do gênero.
Espaço pronto, voltemos para a imagem mental que você construiu. Antes de começar a ler a invocação, é preciso ter bem firme a imagem da divindade. Cor do cabelo, voz, postura, os olhos...
Minha imagem de Hefesto é de um homem de meia idade, muito alto e forte, coberto de fuligem, com barba espessa e cabelos negros. Olhos duros, sempre brilhando ao refletir o fogo de sua forja. Com um andar falho – manco, mas ainda assim imponente à sua maneira. Feições sempre severas que não expõe duvidas ou fraquezas, e oculta a bela alma de um artista capaz de produzir incrível beleza.
Com a visualização firme, tenha convicção de que aquela é a imagem do deus. Tenha consciência que no ritual você usará sua visualização como uma vestimenta e vai travestir-se com a mesma – você usará a imagem do deus ou deusa como uma segunda pele.

Assumindo uma forma divina


É bom esclarecer que essa Invocação Verdadeira não é uma possessão ou uma incorporação. Estes são conceitos diferentes, que explicarei em textos futuros....ou não, vai depender da minha preguiça de escrever.
No centro do Círculo traçado, em frente do altar, separe um tempo para uma breve meditação. Afaste os pensamentos do mundo cotidiano, lembre-se de qual é o seu objetivo para execução deste ritual – concentra-se no objetivo ajudará você a focar nas energias especificas para o ato mágico.
Use uma palavra simplificada do intento, neste caso, "talento" ou "resistência". Repita as palavras silenciosamente ou como sussurros e feche os olhos. Continue o mantra silencioso, incline a cabeça para cima e levante os braços, com as palmas voltadas para o céu.
 Ainda de olhos fechados, visualize um redemoinha prateado acima de você, brilhando no escuro. Veja-o como uma luz cósmica, parecido com uma galáxia em espiral no telescópio. Mas com uma forma mais cônica. Continue repetindo, silenciosamente, as palavras que você escolheu. Concentre-se na espiral cósmica de luz e veja-a aproximando-se de você, sinta a energia pulsante aproximando-se. Reconheça os aspectos divinos dessa energia.
Enquanto inspira profundamente, comece a abaixar os braços devagar. A ideia é que você sinta e imagine – com os olhos fechados – que a energia está entrando em você gradualmente pelo topo da cabeça enquanto realiza a ação.
Abra os olhos. A sensação é de estar em um estado de percepção levemente alterado. Mais do que as visualizações e do mantra, este estado se dá pelo poder divino que acabou de acessar.
Olhe os símbolos que você reuniu em honra a Hefesto (neste exemplo). Não medite sobre eles, deixe que seu subconsciente se encarregue de capta-los.
Aqui você começa a ler a invocação que escreveu. Elas são mais que palavras ditas de forma mecânica, cada palavra deve ter um impacto.
Imagine, com os olhos abertos, que a aura prateada reluzente está mudando de forma em torno de você. Esta forma pouco a pouco assumirá a forma de Hefestos.
Apesar de não haver regra quanto a velocidade com que você assume a forma divina, pode ser mais fácil você visualizar as mudanças enquanto recita a invocação. Primeiro as mudanças gerais e depois os detalhes – como moldar uma imagem na argila. Primeiro a forma antropomórfica, depois um esboço das roupas e por fim as características especificas, como cintos e acessórios. Depois deste "aquecimento", trabalhe o rosto.
Terminando de recitar, feche os olhos e conclua a visualização. Reforce-a, retoque-a.
Agora, paramentado e permeado com a forma de Hefesto, comece a atuar no ritual. Ao contrário do que pode-se imaginar, a atuação pode até facilitar a visualização. Ande como Hefesto andaria, mantenha uma feição que estaria no rosto do deus, gesticule como ele faria...não é preciso manter a visualização do cone prateado, apenas a visualização da forma divina cercando você enquanto realiza a magia.
Quando a cerimônia terminar, você vai querer voltar ao seu estado normal de consciência. Anuncie em voz alta que o ritual acabou, agradeça a presença da divindade que lhe prestou auxilio. Não se despesa do deus como se estivesse dispensando um funcionário, como eu já escrevi, os deuses não são temperos em prateleira.
Após agradecer, feche os olhos e visualize a forma divina transformando-se vagarosamente na antiga aura prateada. Inspire profundamente e a cada expiração pausada, imagine a aura se dissipando mais e mais na forma de uma névoa reluzente.

Concluindo


Como sempre, acabei me alonguei demais no texto. Mas espero que dentre a minha profunda redundante redundância você tenha captado a essência da coisa.
Resumindo a explicação à uma síntese máxima, a invocação é chamar para o interior, a evocação é chamar para o externo.


5 comentários :

  1. Por vezes estudar completamente sozinho traz muitos desafios, muitas dúvidas. Será que erro? Será que acerto? Será isso mesmo? E duvidar é anular poder de todo um ritual, assim como de si mesmo. É desacreditar no que se está fazendo por pura falta de concelho, de norte. Lendo o blog encontro inúmeras respostas a questões simples, que me surgiam por pura ingenuidade, por pura mania de comparar métodos, estilos, escolas... Por pura mania de encontrar muitos estilos e acabar não se encontrando em um mar de conhecimento. Ler este blog está possibilitando um estudo mais leve, mais confiável por que ele é escrito por pessoas que também buscam constantemente o saber, e debatem isso entre si para chegar a um entendimento. É talvez como dizem: Nenhum caminho é completamente solitário.

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    1. Agradeço as palavras meu caro Andrigo!
      O blog foi criado justamente para ajudar vocês. Fico feliz em saber que estamos alcançando o objetivo

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  2. O que mais me prende a absolutamente todos os post deste blog, e acompanha-lo a cada dia o que tem de novo, é o fato de toda a explicação ter um exemplo simples porém útil, porque sempre que lemos algo em algum lugar , as explicações são até razoáveis porém os exemplos são totalmente sem pé nem cabeça. Mas de Qualquer maneira Hekator, parabéns você é maravilhoso, adoro ler tudo o que você escreve.

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    1. Fico MUITO feliz do texto ser de seu agrado Yasmin, espero que continue sempre conosco e vamos procurar fazer das postagens algo mais regular

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  3. Valeu pelo texto mas... (maldito mas) vcs poderiam fazer um post sobre os aspectos..."peculiares" ou "mal-compreendidos" ou que seja, o lado ruim dos deuses que as pessoas não estão muito familiarizadas, porque, pelo menos, acredito eu, que isso possa se tornar bem perigoso caso alguem designe, por exemplo, a proteção da casa para um Deus q não conhece por completo, e se possivel, o q fazer pra conhecer esse lado com uma marge de segurança maior? vlw

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